Presentation in the Temple (Philippe de Champaigne,
1648)
A festa da Praesentatione Domini, que celebramos
neste domingo, em unidade com toda Igreja universal, remonta de antigas
tradições (houve tempo em que era celebrada em 14 de fevereiro, 40 dias após a
Epifania). É lembrada também com uma nuance mariana, assumindo o ‘subtítulo’ de
“Festa da Purificação da Bem-aventurada Virgem Maria”. Falando de ‘purificação’,
parece-nos estranho atribuí-la a Maria Santíssima, tota pulchra! “Esse termo nem sempre denota algo negativo; nesse
trecho do evangelho (Lc 2,22-40), a impureza não é moral, mas ritual (Lv
12,2-4) e significa apenas que, após aqueles ritos, as pessoas eram reinseridas
na esfera da vida comunitária, de forma análoga a uma âmbula que, de modo
inverso, após ser purificada, deixa o sacrário e pode ser mantida junto com
outros objetos”.
Sendo assim, a
Festa da Apresentação nos relembra estes dois fatos importantes para o
cumprimento ritual judaica: a apresentação do menino no Templo diante do
sacerdote com a expiação e a purificação da mãe para reinserção na comunidade
judaica. Ambas as práticas são realizadas segundo prescrição da lei mosaica,
ocorrendo 40 dias após o nascimento; porém dentro da espiritualidade
cristã-litúrgica, a partir a encarnação divina, este rito assume um novo
sentido de fé.
Ícone grego da Apresentação do Senhor
“Omnipotens sempiterne Deus, maiestatem tuam
supplices exoramus, ut sicut Unigenitus Filius tuus hodierna die cum nostrae
carnis substantia in templo est praesentatus, ita nos facias purificatis tibi
mentibus praesentari. Per Dominum nostrum Iesum Christum, Filium tuum, qui
tecum vivit et regnat in unitate Spiritus Sancti, Deus, per omnia saecula
saeculorum”.
Coleta da Festa da Apresentação do
Senhor
Antigo santinho retratando a profecia de Simeão
Ao ser levado ao
templo por José e Maria, Jesus menino é oferecido ao Senhor Javé: Simeão e Ana,
iluminados pelo Espírito Santo, reconhecem no menino frágil e pobre o Messias
esperado por Israel e profetizam sobre Ele; são eles portadores da promessa, da
esperança de um povo que espera libertação! A circuncisão de Cristo, que é o
rito próprio da apresentação do recém-nascido no templo, é um gesto ligado à
Páscoa hebraica, memorial da libertação da escravidão. Assim, mesmo cumprindo o
ritual judaico, é pela circuncisão do coração transpassado na cruz que a
escravidão opressora da humanidade é vencida e a libertação triunfa na vitória
da vida sobre a morte. Já assumido a carne humana, pela circuncisão o Filho do
Pai Eterno ainda assume a identidade de um povo: passa a pertencer ao povo de
Israel, e por vocação eterna, passa a ser o ungido, recebendo o nome de
‘JESUS’, para salvar este mesmo povo e levá-lo (levar-nos) a Terra Prometida! A
Festa da Apresentação é a ligação do Natal e da Páscoa de Cristo!
Como é belo
olharmos a Liturgia da Igreja não em seus pormenores ou detalhes (por vezes
externos), mas em sua totalidade e profundidade, assim descobrindo sua real
unidade e beleza!
Representação etíope da Apresentação do Senhor
“Estamos na presença de um mistério, ao mesmo
tempo simples e solene, no qual a Santa Igreja celebra Cristo, o Consagrado do
Pai, como primogênito da nova humanidade”, afirma o Papa emérito Bento XVI, na Festa
da Apresentação e Dia da Vida Consagrada de 2013. Pelo mistério da vida de
Cristo somos hoje, filhos de Deus e membros da Igreja, os portadores da
profecia, da esperança, da salvação e da libertação àqueles que ainda jazem
entre as trevas, antigas e novas, existenciais, morais e sociais.
Também neste
dia, na comemoração litúrgica, costuma-se realizar a bênção das velas. Tão
singelo gesto quer, em si, abençoar a luz! É a luz da nossa fé que se une a fé
do Cristo e da Igreja; como duas velas que se unem para formarem uma só chama,
ardente e destemida! Cristo se nos apresenta como o escolhido de Deus, “Luz que
brilha aos gentios para a glória de Israel, vosso povo”; é o Sumo Sacerdote
fiel e misericordioso, que acende nossa vida com a graça santificante do Pai.
Apresentação do Senhor: Festa da luz!
Como na
solenidade da Epifania, hoje Cristo é apresentado como luz! A tradição católica
do Oriente chama esta festa de “συνεδρίαση
της ομάδας” (Festa do Encontro), justamente pelo fato de que, sendo na
Epifania o Encontro dos Magos na intimidade da Família Sagrada, hoje Cristo se
encontra definitivamente com sua missão: ser luz e acender luzeiros no mundo
(os santos) e encontrar/reunir no seu coração misericordioso os dispersos da
casa de Israel. Hoje, em Cristo e por Maria, Deus faz com a humanidade o seu
encontro de salvação, com a promessa da Jerusalém celeste, novo céu e nova
terra, nossa morada!
Apresentação do Senhor pela representação africana
Maria encerra em
si o sentido desta festa: a Mãe da luz, a toda iluminada, portadora da paz e da
esperança, que nos aponta o caminho da luz, tem sua alma transpassada! A
espiritualidade desta liturgia não nos encerra nossa visão aqui, mas nos aponta
a espada e o sofrimento como decorrência da fé. O mistério da ressurreição e
alegria aqui tem seu início: a espada de Maria é a nossa espada; a cruz de
Cristo é nossa cruz; a salvação de Cristo é o Seu e o nosso sofrimento.
“Salve, ó Virgem, Mãe de Deus, cheia de
graça, pois de ti nasceu o sol de justiça, o Cristo, nosso Deus, iluminando os
que estão nas trevas.
Alegra-te, ó justo ancião, ao
receber em teus braços o libertador das nossas almas, que nos dá a
ressurreição.
Vamos também nós ao encontro de
Cristo, com cânticos inspirados e acolhamos aquele do qual Simeão viu a
salvação.
É aquele que Davi anunciou, o que
falou pelos profetas, o que se encarnou por nós e nos instrui com a lei.
Adoremo-lo!”.
Antigo hino litúrgico
da Festa da Apresentação
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