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sábado, 9 de fevereiro de 2013

Deus estava em Santa Maria? Resposta ao “ateísmo preguiçoso” do Brasil

Por Pe. Anderson Alves*


A tragédia em Santa Maria mobilizou o Brasil. Todos se emocionaram com o terrível ocorrido, que levanta várias perguntas. Os cristãos se compadecem com os envolvidos na tragédia e interpretam aqueles eventos à luz da vitória de Cristo sobre o mal e a morte. Come Ele venceu, cremos que vencemos com Ele todo mal, injustiça, incompreensões e inclusive a morte. Certamente, no momento atual devemos nos unir em solidariedade para com as vítimas e seus familiares e também exigir das autoridades uma investigação séria, de modo que os culpados respondam pelas consequências dos seus atos. Também é tempo de reconhecer os erros cometidos e de tomar as necessárias medidas para evitar que algo semelhante possa se repetir no futuro.

Aquela terrível tragédia levanta várias perguntas, algumas justas, outras nem tanto. Perguntamo-nos principalmente o porquê desse tipo de tragédia, que traz sofrimento a tantas pessoas. Os cristãos, que sofrem com o ocorrido, se uniram numa corrente de orações e de solidariedade para com as vítimas. Entretanto, infelizmente, nessas ocasiões se sentem atacados por perguntas impertinentes, que não ajudam a aliviar o sofrimento de ninguém, mas somente buscam colocar em questão a fé cristã. «Como pode Deus ter permitido o ocorrido?», questionam alguns. E outros, talvez mais ousados e menos respeitosos, chegam a dizer: «Vê-se mesmo que Deus tem um plano de amor para com todos e que às vezes esse plano consiste em eliminar a vida de 235 jovens inocentes para mostrar assim seu amor para com os seus familiares e amigos».

Esse último tipo de afirmação, além de ser uma grosseria e uma falta de respeito absurda, mostra uma terrível falta de lógica e uma ignorância religiosa espantosa. Qualquer um de bom senso poderia questionar: foi Deus que construiu uma grande discoteca com uma só saída e sem portas e luzes de emergência? Foi ele que a fez com um teto de papel e revestido de uma espuma inflamativa e tóxica?

O que falta aos que ignoram ou distorcem a fé cristã é o elementar conhecimento de que Deus fez o homem livre, de modo que Ele é responsável por ter nos dado a liberdade, mas não por cada ato da nossa liberdade. Ele colabora conosco quando fazemos atos bons movidos pela graça, mas os atos maus, Ele simplesmente tolera. Deus não pode jamais querer o mal, nem direta, nem indiretamente. Em palavras do Papa Bento XVI «Deus, criando criaturas livres, dando liberdade, renunciou a uma parte do seu poder deixando o poder da nossa liberdade. Assim Ele ama e respeita a livre resposta de amor ao seu chamado»
[i]. Além Disso, Ele não é um “Deus tapa-buracos”, que vai preenchendo as lacunas abertas pela irresponsabilidade humana. E é no mínimo absurdo responsabilizar a Deus por uma tragédia, quando é evidente que há tantos responsáveis.Foi Ele que fez entrar naquele lugar mais pessoas do que o número devido? Foi Ele que fez um espetáculo pirotécnico num lugar repleto de material inflamável? Foi ele que bloqueou a única saída da discoteca por alguns preciosos minutos? Bastaria responder a essas perguntas para perceber quem efetivamente tem a culpa daquele trágico evento.

Mais esse tipo de perguntas mostra algo mais sério: uma espécie de ateísmo prático que toma conta do modo de pensar e de agir de uma parte da nossa população. Esse tipo de ateísmo superficial e emotivo consiste em viver como se Deus não existisse e, quando ocorre alguma tragédia, joga-se a culpa toda em Deus, para assim minimizar as responsabilidades dos verdadeiros culpados. E quem o faz, nem se dá ao trabalho de se perguntar como é possível que um Deus que não existe, seja o responsável por todas as tragédias humanas. Prefere-se crer num ateísmo prático e aparentemente cômodo no qual se procura viver em total autonomia de Deus, da verdade e da moralidade e se espera que, nas situações de risco, Deus abra milagrosamente uma “saída de emergência” para livrar ao homem de qualquer perigo.

Felizmente Deus é um ser extremamente inteligente e não age conforme pensa esse tipo de ateísmo preguiçoso. Dizemos “preguiçoso” devido à pouca quantidade e qualidade dos argumentos. Deus é inteligente, cheio de amor e leva a sério a liberdade humana e a natureza das coisas por Ele criadas.  Certamente Ele pode fazer milagres e nas situações de risco e de tragédias há sempre relatos de milagres. Como, por exemplo, em janeiro de 2011, por ocasião das chuvas da região serrana do Rio de Janeiro, quando um homem e seu filho foram arrastados pela correnteza por mais 4 kms e saíram ilesos[ii]. Deus tem o poder de fazer milagres, mas esses são sempre um dom imerecido e nunca algo que possa ser exigido. Ordinariamente, Ele respeita a ordem da natureza que criou e não anula jamais a liberdade de ninguém, nem mesmo a dos que o abandonam ou ofendem.

Então, Ele não seria suficientemente forte para evitar o mal? Isso é outra pergunta que só faz sentido para quem conhece parcialmente o Cristianismo, se esquecendo do principal: Deus deu uma resposta ao mal, enviando seu Filho que morreu na Cruz e sofreu todos os nossos males. Desse modo, Ele transformou o maior mal feito pelos homens, o assassinato do Filho único de Deus, no maior ato de amor. Assim a maldade e irracionalidade humana foram mudados num ato divino de entrega ao Pai, com o qual trouxe a redenção dos homens e a vitória definitiva sobre o mal. Os cristãos tem sempre diante de si a Cruz de Cristo, resposta última ao mal, oferecida por um Deus bom, que se compadece conosco, a ponto de dar-nos a sua mesma vida. Ao olhar para a Cruz e Ressureição do Senhor, os cristãos alcançam a certeza de que «o bem é mais poderoso na sua bondade do que o mal na sua maldade» (S. Tomás de Aquino). Certamente isso é um grande mistério, do qual é sempre difícil falar. Mas «se é difícil para um cristão explicar o mistério do mal no mundo, para um ateu é praticamente impossível reconhecer a presença do bem» (Fulton Sheen).

*Pe. Anderson Alves, sacerdote da diocese de Petrópolis – Brasil. Doutorando em Filosofia na Pontificia Università della Santa Croce em Roma.


Fonte: http://humanitatis.net/?p=8204
Enviado ao Dominus Vobiscum pelo próprio autor.




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