A Igreja encerra seu Ano Litúrgico com a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. Contudo, poucos têm conhecimento de que se se trata de uma celebração relativamente recente, pois fora instituída em 1925, ou seja, oitenta e oito anos atrás, por Sua Santidade o Papa Pio XI, por meio da encíclica "Quas Primas".
Mas qual seria a razão pela qual o Santo Padre dedica uma encíclica à criação de uma festa litúrgica?
No início do século XX, o mundo, que ainda estava se recuperando da Primeira Guerra Mundial, fora varrido por uma onda de secularismo e ódio à Igreja, como nunca visto na história do Ocidente. O fascismo na Itália, o nazismo na Alemanha, o comunismo na Rússia, a revolução maçônica no México, anti-clericalismos e governos ditatoriais grassavam por toda parte. É neste contexto que, sem medo de ser literalmente "politicamente correto", o Papa Pio XI institui uma festa litúrgica para celebrar uma verdade de nossa fé: mesmo em meio a formas diversificas e injustas de governo e perseguições à Igreja, Nosso Senhor Jesus Cristo continua a reinar sobre toda a história da humanidade.
Eis alguns fragmentos da encíclica "Quas Primas":
Testemunho da Liturgia.
9. Desta doutrina comum a todos os livros santos, naturalmente dimana a seguinte conseqüência: justo é que a Igreja Católica, reino de Cristo na Terra, chamada a estender-se a todos os homens, a todas as nações do universo, multiplicando os preitos de veneração, celebre, no ciclo anual da Liturgia Santa, a seu Autor e Instituidor como a Rei, como a Senhor, como a Rei dos reis. Com admirável variedade de fórmulas, estas homenagens expressam um e o mesmo pensamento; desses títulos servia-se a Igreja outrora no divino ofício e nos antigos sacramentados; repete-os ainda agora, nas preces públicas, que todos os dias dirige à Infinita Majestade e na oblação da Hóstia Imaculada. Nesse louvor ininterrupto de Cristo-Rei, nota-se para logo a formosa harmonia dos nossos ritos com os ritos orientais, verificando-se aqui também a verdade, do prolóquio: "as normas da oração confirmam os princípios da Fé".
Argumento teológico.
10. O fundamento sobre que pousa esta dignidade e poder de Nosso Senhor, define-o exatamente S. Cirilo de Alexandria, quando escreve: "Numa palavra, possui o domínio de todas as criaturas, não pelo ter arrebatado com violência, senão em virtude de sua essência e natureza" (In Lucam, 10). Esse poder dimana daquela admirável união que os teólogos chamam de "hipostática". Portanto, não só merece Cristo que anjos e homens O adorem como a seu Deus, senão que também devem homens e anjos prestar-Lhe submissa obediência como a Homem. E assim, só em força dessa união, a Cristo cabe o mais absoluto poder sobre todas as criaturas, posto que, durante sua vida mortal, renunciasse ao exercício desse domínio.
Oportunidade da festa.
21. Para Nós também soou a hora de provermos às necessidades dos tempos presentes e de opormos um remédio eficaz à peste que corrói a sociedade humana. Fazemo- lo, prescrevendo ao universo católico o culto de Cristo-Rei. Peste de nossos tempos é o chamado "laicismo", com seus erros e atentados criminosos.
Grande impulso à piedade dos fiéis.
34. Que energias, além disso, que virtude não poderão os fiéis haurir da meditação destas verdades, para amoldar seus espíritos aos princípios verdadeiros da vida cristã! Se todo o poder foi dado ao Senhor Jesus, no céu e na terra, se os homens, resgatados pelo seu sangue preciosíssimo, se tornam, com novo título, súditos de seu império, se, finalmente, este poder abraça a natureza humana em seu conjunto, é claro que nenhuma de nossas faculdades se pode subtrair a essa realeza. É mister, pois, que reine em nossas inteligências: com plena submissão, com adesão firme e constante, devemos crer as verdades reveladas e os ensinos de Cristo. É mister que reine em nossas vontades: devemos observar as leis e os mandamentos de Deus. É mister que reine em nossos corações: devemos mortificar nossos afetos naturais, e amar a Deus sobre todas ,as coisas. É mister que reine em nossos corpos e em nossos membros: devemos transformá-los em instrumentos, ou, para falarmos com S. Paulo (Rom 6, 13), "em armas de justiça, oferecidas a Deus", para aumento da santidade de nossas almas. Eis os pensamentos que, propostos à reflexão dos fiéis e atentamente ponderados, hão de facilmente levá-los a mais elevada perfeição.
Encerrar o Ano Litúrgico com a Solenidade de Cristo Rei é consagrar a Nosso Senhor o mundo inteiro, toda a nossa história e toda a nossa vida. É entregar à sua infinita misericórdia um mundo onde reina o pecado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
PIO XI Carta Encíclica Quas Primas sobre Cristo Rei. II edição. Editora Vozes LTDA: Rio de Janeiro, 1950.
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